O poeta Paulo Leminski faria 80 anos no dia 24 de agosto de 2024, e ele foi um dos escritores brasileiros que continua a expandir o seu público leitor mesmo depois de sua partida. Veja mais!
Certamente você já deve ter lido pelo menos alguns dos poemas do Leminski. Isso porque, além de ser um poeta bastante conhecido, ele nos deixou uma obra vasta que permeia diversas vertentes da poesia, como haikais, concretismo e marginal. A antologia de poesia do poeta curitibano permanece nos rankings de livros mais vendidos do país, e o seu trabalho com a palavra inspira gerações de escritores.
Após ter sido expulso do mosteiro de São Bento, onde estudou latim, filosofia, literatura grega e clássica e teologia, ele foi aprofundar seus estudos em história, latim, francês e hebraico. Ele participou da Semana Nacional de Poesia de Vanguarda, no ano de 1963, e conheceu o movimento da Poesia Concreta, que era composto por Augusto de Campos, Décio Pignatari e Haroldo de Campos.
Confira, a seguir, mais detalhes sobre o trabalho desse poeta que influencia tantos leitores e escritores ao redor do mundo e permanece sempre presente na literatura brasileira.
Quem foi o poeta Paulo Leminski
Paulo Leminski, filho de pai polonês e mãe de ascendência africana e indígena, nasceu em 24 de agosto de 1994, na cidade de Curitiba, no Paraná. Além de ter sido poeta e de ter morado em um mosteiro, o escritor exerceu diversas outras funções ao longo de sua vida, entre elas: tradutor, compositor, professor de cursinho de pré-vestibular, redator publicitário, jornalista, biográfo e crítico literário.
Também conhecido como o “poeta pop” do Brasil ou “poeta multifacetado”, Leminski escrevia seus versos sem letras maiúsculas, sem palavras difíceis de entender, sem pontuação e com uma simplicidade e profundidade que vestem seu estilo e atraem a atenção até de quem não costuma ler poesia.
Amante da cultura japonesa, ele se interessou pelo zen-budismo e chegou a escrever a biografia de um dos mestres da poesia haikai, o poeta Matsuo Bashô. Além do japonês, Leminski conhecia mais outras línguas e publicou obras em inglês, latim, francês, espanhol e italiano.
No ano de 1968, o escritor se casou com a poeta Alice Ruiz, que também compartilhava o amor por haikais, e juntos eles tiveram três filhos, Miguel Ângelo, Áurea e Estrela.
Conheça as obras do escritor
Pela sua ampla gama de influências, Paulo Leminski, que faleceu em 1989, conseguiu desenvolver um estilo só seu na poesia, e nos outros estilos em que publicou também, entre eles as obras de biografias, os romances e as obras infantojuvenis.
Poesia
Entre as principais obras de poesia do escritor Paulo Leminski, estão:
- Quarenta clics em Curitiba (1976);
- Polonaises (1980);
- Caprichos e relaxos (1983);
- Um milhão de coisas (1985);
- Distraídos venceremos (1987);
- La vie en close (1991);
- Metamorfose (1994; livro que ganhou o Prêmio Jabuti de Poesia de 1995);
- O ex-estranho (1996);
- Winterverno (2001).
Em 2013, foi lançada a antologia “Toda Poesia” (Companhia das Letras) de Paulo Leminski, reunindo haikais, canções, e poemas concretos e líricos que o autor escreveu ao longo de sua vida.
A obra conta com a apresentação da poeta que foi sua companheira, Alice Ruiz, e o posfácio do compositor José Miguel Wisnik, além de conter vários textos de autores e compositores no apêndice, entre eles Caetano Veloso, Haroldo de Campos e Leyla Perrone-Moisés.
Romances
Nos romances, uma caractérista do autor que ganhou destaque foi a de experimentar a linguagem e criar novas palavras.
- Catatau (1975);
- Agora é que são elas (1984).
Biografias
- Cruz e Souza — o negro branco (1983);
- Bashô — a lágrima do peixe (1983);
- Jesus a.C. (1984);
- Trotski — a paixão segundo a revolução (1986).
A Companhia das Letras reuniu as quatro biografias escritas por Leminski ao longo da década de 1980 em um só volume chamado de “Vida: Cruz e Sousa, Bashô, Jesus e Trótski“.
Infantojuvenis
- Guerra dentro da gente (1986);
- A lua no cinema (1989).
Composições
O poeta Leminski também escreveu diversas composições que foram cantadas por grandes artistas da música brasileira, como:
- Verdura (1980), na voz de Caetano Veloso;
- Promessas demais (1982), na voz de Ney Matogrosso;
- Mancha de Dendê não sai e Leda (1997), na voz de Moraes Moreira;
- Mudança de Estação (1996), na voz da banda A Cor do Som;
- Hard Feeling (1990), na voz de Itamar Assumpção;
- Luzes (2007), na voz de Arnaldo Antunes.
Poemas de Paulo Leminski
A obra do poeta Paulo Leminsi traz muito a questão da metalinguagem, de falar sobre o próprio trabalho de escrever poesia e da sua visão sobre o que é escrita, os seus propósitos e a literatura em geral.
Em seus poemas, o escritor nos convida a experimentar novas formas de ler e escrever, como um diálogo que vai além das páginas e nunca termina.
Razão de ser
Escrevo. E pronto.
Escrevo porque preciso,
preciso porque estou tonto.
Ninguém tem nada com isso.
Escrevo porque amanhece,
E as estrelas lá no céu
Lembram letras no papel,
Quando o poema me anoitece.
A aranha tece teias.
O peixe beija e morde o que vê.
Eu escrevo apenas.
Tem que ter por quê?
Contranarciso
em mim
eu vejo
o outro
e outro
enfim dezenas
trens passando
vagões cheios de gente centenaso outro
que há em mim é você
você
e vocêassim como
eu estou em você
eu estou nele
em nós
e só quando
estamos em nós
estamos em paz
mesmo que estejamos a sós
Não discuto
não discuto
com o destino
o que pintar
eu assino
Bem no fundo
No fundo, no fundo,
bem lá no fundo,
a gente gostaria
de ver nossos problemas
resolvidos por decretoa partir desta data,
aquela mágoa sem remédio
é considerada nula
e sobre ela — silêncio perpétuoextinto por lei todo o remorso,
maldito seja quem olhar pra trás,
lá pra trás não há nada,
e nada maismas problemas não se resolvem,
problemas têm família grande,
e aos domingos
saem todos a passear
o problema, sua senhora
e outros pequenos probleminhas.
O que quer dizer
O que quer dizer diz.
Não fica fazendo
o que, um dia, eu sempre fiz.
Não fica só querendo, querendo,
coisa que eu nunca quis.
O que quer dizer, diz.
Só se dizendo num outro
o que, um dia, se disse,
um dia, vai ser feliz.
Eu
quando olho nos olhos
sei quando uma pessoa
está por dentro
ou está por foraquem está por fora
não segura
um olhar que demorade dentro do meu centro
este poema me olha
Eu queria tanto
ser um poeta maldito
a massa sofrendo
enquanto eu profundo medito
eu queria tanto
ser um poeta social
rosto queimado
pelo hálito das multidões
em vez
olha eu aqui
pondo sal
nesta sopa rala
que mal vai dar para dois
Pergunte ao pó
cresce a vida
cresce o tempo
cresce tudo
e vira sempre
esse momentocresce o ponto
bem no meio
do amor seu centro
assim como
o que a gente sente
e não diz
cresce dentro
A poesia é um inutensílio
Veja o documentário Ervilha da Fantasia (1985), dirigido por Werner Schumann em 1985, onde Paulo Leminski fala sobre poesia e seu trabalho com a palavra:
“O poeta não se define pelos conteúdos que ele veicula (…) o poeta se define sobretudo por uma capacidade de criar beleza com linguagem”.
moinho de versos
movido a vento
em noites de boemia
vai vir o dia
quando tudo que eu diga
seja poesia
Lindo demais, né? Espero que saber mais um pouco sobre quem foi o poeta Paulo Leminski e ler alguns de seus poemas tenha inspirado você a ler mais sobre a sua obra e a brincar com as palavras também!